sexta-feira, 16 de agosto de 2013

EVANGELHO DE MT 19, 3-12

            Para que se entenda a mensagem do Evangelho de hoje é importante fazermos uma recapitulação da dinâmica catequética do evangelista. Todo o evangelho de Mateus é como se fosse uma catequese que ele dá para a sua comunidade, que é composta por judeus convertidos ao cristianismo. Essa catequese pode ser dividida em cinco encontros, que no Evangelho são chamados de “livrinhos”. O episódio de hoje está no capítulo 19 que é o início do “Quinto Livrinho”, que traz como tema “A Vinda Definitiva Do Reino”, que vai até o final do Evangelho.
            Dentro do quinto livrinho o evangelista quer mostrar para esses judeus convertidos como esse Reino de Deus acontece inserido e contextualizado na história. Mostra-nos, também, que é a partir da ação messiânica de Jesus que este Reino se faz presente, e que, quando repetimos em nós e por de nós, as ações de Jesus contribuímos para que o Reino de Deus aconteça no hoje da nossa história. Diante do matrimônio indissolúvel, os discípulos observam que o celibato é melhor. Jesus mostra que a escolha do celibato é dom de Deus, e que este só adquire todo o seu valor quando é assumido com plena liberdade em vista do serviço ao Reino.
            Jesus recusa a ver o matrimônio a partir de permissões ou restrições legalistas. Ele reconduz o matrimônio ao seu sentido fundamental: aliança de amor e, como tal, abençoada por Deus e com vocação de eternidade. Diante desse princípio fundamental, marido e mulher são igualmente responsáveis por uma união que deve crescer sempre, e os dois se equiparam quanto aos direitos e deveres. Com isto o evangelista procura mostrar a dimensão profunda do matrimônio como sendo uma aliança eterna de amor. Isto para lembrar da aliança eterna de amor entre Deus e a humanidade que foi selada com o sangue de Jesus derramado na cruz.
            Que nós saibamos trabalhar a dimensão da acolhida para com o outro. Que tenhamos gestes de ternura para com nossos irmãos. Que saibamos resgatar sempre nossas alianças e que sejam elas marcadas pelo amor, não somente o matrimônio, mas toda e qualquer união. Que Deus abençoe as nossas famílias, dê vida e força para os casais superarem as dificuldades e os conflitos do dia. Que nossas uniões sejam abençoadas por Deus. Amém! 

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

CRISTO RECRIADOR DO HOMEM E DOS SEUS DIREITOS (POR JOSÉ BAKIR)

1.  Introdução
            Um dos direitos primordiais, e talvez o principal, é o direito a vida. Desenvolver a temática de uma moral social relacionada aos Direitos Humanos é ter como pano de fundo o direito de cada ser humano a viver a sua liberdade sem infligir, ou burlar, a liberdade do outro. É preciso ter sempre em mente que a vida é marcada pela presença, e ao mesmo tempo, pela ausência do outro que me interpela.
            Neste sentido a ética social “é configurada como um saber crítico e específico sobre o compromisso moral dos crentes”[1]. A partir desta afirmação de Vidal cabe a cada um se perguntar sobre o seu compromisso moral, ou melhor, sobre seu compromisso moral social. Esta reflexão deve ser marcada pela temática que perpassa a prática messiânica de Jesus segundo o evangelista João que é a vida (cf. Jo 10, 10).
            Neste trabalho será abordada a questão do direito a vida como direito primordial do ser humano, levando em consideração tudo o que foi estudado em sala de aula e a Declaração Universal dos Direitos Humanos.  O primeiro ponto aborda o direito que Cristo confere ao homem, o segundo ponto aborda – diretamente – a vida como um direito a ser respeitado.

2.  Direito que Cristo confere ao homem
Dentro do que se pode dizer de “direito que Cristo confere ao homem”, ou melhor, ao ser humano se faz presente, e de forma latente, o direito a vida. O que se percebe na pessoa de Cristo é que tudo o que ele falou e fez não transmite outra mensagem a não ser o direito a vida que o ser humano tem.
            É interessante perceber que a questão da vida é tratada, em Jesus, como um dom supremo que Deus confere aos filhos teus, aos seus queridos. É claro que esta vida deve ser vivida como uma resposta gratuita a este amor que Deus tem pela humanidade. Neste sentido, alguns questionamentos podem ser feitos a partir desta reflexão: qual é a situação do homem no mundo? Quais são os seus direitos? A tais questões a revelação bíblica oferece uma resposta, não teórica e abstrata, mas, vivente e edificante, uma resposta que consiste em intervir na situação do homem e em dar ao homem novos direitos.
            Aqui há a percepção de que já no A.T. se vive e se anuncia esta resposta. É uma resposta que encontra na pessoa de Jesus seu sentido pleno e vivificante, pois, o próprio Cristo, com o dinamismo de sua existência, revela a vocação do homem e lhe dá a plenitude do seu cumprimento.
            O texto joanino trata do direito que Cristo confere ao homem por meio do Espírito Santo: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundancia”[2]. Neste texto joanino está presente o direito que Cristo confere ao homem por meio de seu Espírito, que é o direito a vida. A vida que Jesus traz é vida plena e perpétua, uma participação, por meio dele, na vida divina. Para isso veio, pois, o homem somente com suas forças não pode alcançá-la. Direito este que Cristo desejou que o ser humano vivesse em sua plenitude. Todos os seus atos e tudo o que ele falou girou em torno deste direito, entendido aqui como o dom supremo.
            Este direito Cristo o compreende em uma perspectiva mais ampla e mais profunda do que a que se encontra na problemática da perspectiva moderna. E uma perspectiva que não se limita exclusivamente a considerar os problemas atuais existentes na pessoa humana. Mas, é uma perspectiva que se eleva aos projetos e se interessa em se aproximar de todos os seres.
            Como já havíamos dito anteriormente o direito que Cristo traz de volta ao homem é o direito a vida, mas, vida entendida aqui como fruto de uma prática cristã. Desta forma, Jesus é o ponto de referência para esta reflexão e o outro ponto é o rosto do outro que me interpela.   Com isto, Cristo confere ao ser humano, por meio do Espírito Santo, uma vida plena.
            A Declaração Universal dos Direitos Humanos traz uma seqüência de 30 artigos que procuram explicitar os direitos do homem e da mulher. A temática que perpassa toda a declaração visa assegurar aos homens e às mulheres direitos básicos fundamentais que lhe garantam o bem maior que eles possuem: a vida[3].
            É inquestionável a valorização do discurso dos direitos humanos, tanto no âmbito político, quanto no econômico e no religioso. O negativo desta afirmação é que, na prática, não há esta valorização. Esta  inquestionável valorização não vai de par com a prática. Os direitos humanos, com todos os limites, seriam uma das únicas veias que se tem para tentar resolver os problemas de caráter global. As culturas sempre estiveram em contato, mas, nunca se enriqueceram.
           
3.      Vida: direito do ser humano
            A discursão da moral social auxilia na compreensão de uma ética que esteja em defesa da vida. Não se trata de fazer uma defesa de maneira desorganizada, impensada, mas, de fornecer subsídios ou meios que de fato sirvam para elaborar uma defesa de modo convincente. 
            Ao instituir a Nova Aliança mediante o dom total de si mesmo o Cristo muda radicalmente a situação do ser humano e confere à humanidade novos direitos. De uma situação de opressão e marginalização, fez surgir uma situação de esperança e de liberdade. Quem adere a Cristo não está mais sujeito a uma condição de escravidão e de temor a morte (Hb 2, 15), pois, Cristo os assegura a vitória sobre a morte mediante a morte mesma (Hb 2, 14). Neste sentido uma questão latente a nossa realidade é: será que o direito a vida é respeitado?
            Em um primeiro momento e olhando a nossa realidade a resposta a esta pergunta é de que este direito primordial do ser humano não está sendo respeitado. Isto reflete em uma práxis  que não está condizente com aquilo que o discurso dos Direitos Humanos prega. Desta forma é necessário refletir criticamente sobre o conteúdo moral presente no discurso e sobre a moral presente, ou melhor, ausente na prática dos Direitos Humanos. O que se pode concluir desta afirmação é que a luta pelos Direitos Humanos não é simplesmente uma luta por predicados, mas, é um luta por Direitos Humanos mais dinâmicos.
            Ainda dentro da perspectiva bíblica Marciano Vidal, em seu texto sobre fundamentação da ética teológica, diz o seguinte:
           
         ...ao considerar o homem a partir da perspectiva da criação, é possível pensar em Deus como alguém que dá sentido e fundamenta a autonomia do homem, a ética cristã teônoma é a expressão da relação normativa de Deus com o homem, relação que não contradiz nem suprime a normatividade autônoma do homem e sim que a possibilita e lhe dá uma fundamentação válida [4].

            É difícil pensar que não haja uma relação intrínseca entre Direitos Humanos e ética social. Mas, é preciso que ambos estejam a serviço e promoção da vida humana. Aqui se compreende vida humana vivida na carne, mas, marcada pela atuação do Deus criador. Esta interpretação que vem dos evangelhos não vem como resposta, mas, sim com pergunta: em que Deus ceio? Que homem sou? Que moral temos?
            É impensável não se perguntar em que Deus cremos. Será um Deus moral, um Deus que não se dá valor a si mesmo, um Deus mestre soberano, um Deus que é um coquetel entre o bom e o verdadeiro, um Deus que é útil porque prescreve o que devemos fazer. Que homem? Não se trata de perguntar sobre uma essência ideal de homem, mas, de afirmar um homem feito à imagem e semelhança de Deus, ou seja, criador. Um homem único individual, pessoal, no exercício de sua tarefa físico-cultural temerário. Não um homem genérico, mas, também, não um homem solitário. Trata-se, portanto, de um homem solidário, aceitando a nossa heteronomia com base no passado e no presente. Que moral? A afirmação de a cada um querer ser moral, a afirmação da vontade. Mas, não indica valores aos quais devemos aderir. Desta forma, trata-se de uma moral que venha a derrubar estes imperativos existentes que são imperativos mentirosos. Talvez a moral que se procure seja moral como anti, procurando dar beleza e repugnando o horror.
            No que diz respeito à defesa da vida Dom Cláudio Hummes, em sua homilia feita por ocasião da V Conferência Episcopal da América Latina e do Caribe, diz o seguinte:

Nós não podemos deixar de trabalhar para vencer a miséria e a fome, a pobreza do nosso povo, o sofrimento do nosso povo. A igreja tem que continuar a se empenhar nisso fortemente, em nome do evangelho de Jesus Cristo. A missão de incluir tudo isso, não separar a evangelização da promoção humana, da defesa da dignidade e dos direitos humanos. E o direito fundamental é o direito a vida, e o direito de viver dignamente como pessoas humanas[5].


            Dom Cláudio Hummes apresenta, de forma resumida, aquilo que a Declaração Universal dos Direitos Humanos traz em seu pano de fundo que é a promoção da vida, da dignidade de seres humanos que muitas vezes é tirada de cada cidadão. Este desejo, esta utopia, tem que ser marcada pela prática do amor fraterno. Este amor tem que ser o critério fundamental de todo ser humano, como diz Francisco M. Rejón: “O amor como critério definitivo de moralidade e de pertença ao Reino de Deus. Não há nada mais exigente que o amor, e ao mesmo tempo nada mais eficaz e libertador que o amor que dá a vida”[6]


4. Conclusão
            É preciso haver discernimento, mas, um discernimento lento e laborioso e tem que ser assim. Isto exige compaixão. Os Direitos Humanos são o lugar desta compaixão, é onde saímos do discurso bonito para exigir do campo político. Sendo assim, se entra no campo da intersubjetividade desejada, querida. O evangelho nos chama a estarmos dentro dos limites do ideal e a esgotarmos os limites do real, pois, não existe outro caminho fora dos limites do real.
            A Bíblia nos convoca novamente a afirmar o Senhorio do Deus que criou a Vida, em Jesus Cristo. Defender e promover os Direitos Humanos é, acima de tudo, assumir atitudes cidadãs e lembrar ao mundo que o Direito à Vida Plena é direito de todas as pessoas humanas, não de algumas poucas privilegiadas que podem consumir. A mensagem central da misericórdia de Deus nos leva a vislumbrar um novo mundo em que todas as pessoas terão sua dignidade e seus direitos respeitados e valorizados


5. Bibliografia

GINO, Concetti. I Diritti Umani. Dottrina e prassi. Roma: Ave, 1982 (pp.23-39)

VIDAL, Marciano. Ética teológica: conceitos fundamentais. Fundamentação da ética teológica. Petrópolis: Vozes, 1999 (pp. 211-228)
________________ Moral de atitudes: moral social. Direitos humanos e ética cristã. Aparecida: Santuário, 1980 (pp.153-191)



[1] VIDAL, Marciano. Ética teológica: conceitos fundamentais. Fundamentação da ética teológica. Petrópolis, Vozes: 1999 (p. 219)

[2] Cf. Jo 10, 10b
[3] Declaração Universal dos Direitos Humanos, artigo 3º.
[4] Ibid nota 1 (p. 219)
[5] Homilia do Cardeal Cláudio Hummes, ofm – 26 de maio de 2007 http://br.celam.info/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=285
[6] Cf. VIDAL, Marciano. Ética teológica. Conceitos fundamentais. Petrópolis: Vozes, 1999 (p. 233)

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

EVANGELHO DE MT 13, 54-58

           Este evangelho de hoje, dentro da dinâmica catequética de Mateus, marca o início do quarto livrinho, que tem como tema “A Igreja – Semente do Reino”, que vai até o final do capítulo 18. Aqui é fundamental que se entenda que não se trata da igreja templo, pois, a igreja enquanto templo já existia e eram chamados de Sinagoga. Mas, sim, de uma Igreja enquanto reunião de pessoas que tinham, ou buscavam ter, a mesma fé, o mesmo objetivo. É o que chamamos de “Igreja, povo de Deus a caminho.
Para o evangelista esta Igreja tem como marca princípios fundamentais que visam tomar decisões e resolver conflitos: a solicitude pela ovelha perdida e pelos pequenos do Reino, o perdão e a humildade. Neste episódio de hoje, os conterrâneos de Jesus colocam a questão sobre a origem da autoridade dele, admirados de seu ensinamento e poderes milagrosos. É impossível que Jesus, sendo um deles, tenha autoridade de Deus. Por isso, eles o rejeitam. Essa rejeição não é acidental: é apenas uma prova a mais de que Jesus é o enviado de Deus. De fato, todos os profetas do Antigo Testamento também foram rejeitados.
Os conterrâneos de Jesus se escandalizam: não querem admitir que alguém como eles possa ter sabedoria superior à dos profissionais e realize ações que indiquem uma presença de Deus. Para eles, o empecilho para a fé é a encarnação, ou seja, é inadmissível que Deus assuma a condição humana e esteja situado dentro do contexto social, situado na história. Isto nos leva a refletir sobre as nossas ações, as nossas atitudes (ou a nossa falta de atitude), para percebermos se o que fazemos ou falamos são atitudes messiânicas, isto é, se são sinais da presença de Deus no hoje da nossa história.
É necessário que façamos uma opção fundamental pelo Reino e nos coloquemos a caminhar para a realização desse Reino no hoje da nossa história. A realidade está bem a nossa porta e é gritante. Os pequenos do Reino batem constantemente a nossa porta e o que nós estamos fazendo? Que atitudes tomamos? Será que estamos sendo sinais da presença de Deus na vida dessas pessoas? Ou simplesmente viramos as costas e dizemos que não é problema meu. O próprio Jesus nos diz que “Todas as vezes que vocês fizeram isso a um dos menores do Reino, foi a mim que o fizeram” (Mt 25, 40)  

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Evangelho Mt 12, 1-8

          Este Evangelho de hoje, na dinâmica catequética de Mateus, pertence ao terceiro livrinho onde o evangelista vai desenvolver o tema “O Mistério do Reino”. Dentro desse terceiro livrinho, que vai até 13, 52, o evangelista vai nos apresentar pistas que nos auxiliarão a compreender e a vivenciar esse Reino. Desta forma, Mateus quer nos convidar a mergulharmos nas profundidades desse Reino que é justiça e amor.
            O centro da obra de Deus é o ser humano, e cultuar a Deus é fazer o bem ao ser humano. Não se trata de estreitar ou alargar a lei do sábado, mas, de dar sentido totalmente ovo a todas as estruturas e leis que regem as relações entre os seres humanos. Porque, só é bom aquilo que faz o ser humano crescer e ter mais vida. Toda a lei que oprime o homem é contra a própria vontade de Deus, e deve ser abolida. Mateus acrescenta um exemplo para mostrar que a lei do sábado não é absoluta. Jesus, como nova presença de Deus entre os homens, é maior do que o templo, e é Senhor do sábado. Por isso, Ele tem poder para relativizar a lei, propondo a misericórdia como atividade fundamental de Deus para com os homens.
            Agindo dessa forma, Jesus nos ensina que a lei é boa desde que esteja a serviço da vida e da liberdade. Cumprir a lei simplesmente por cumprir, porque é um preceito, é algo que não tem sentido, é um gesto vazio e sem significados. Outra vez aparece o tema da misericórdia. Mateus repete uma frase dita pelo profeta Oséias “Quero misericórdia e não o sacrifício” porque percebe um enrijecimento  por parte de algumas pessoas, o que impede a comunidade de crescer e de ter uma vivencia da vida fraterna.
                Acredito que está na hora de deixarmos de lado a nossa hipocrisia que se fundamenta em falsas convicções religiosas e deixar que a misericórdia fale mais forte em nossos corações. É preciso que nos aproximemos mais uns dos outros, mas com amor no coração para acolhermos o nosso irmão que sofre. Que nós sejamos mais misericordiosos para com o nosso próximo e façamos a vida acontecer. Vida, essa, que tem como força motora o amor.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Evangelho Mt 9, 9-13

           Este episódio de hoje, que é o chamado de Mateus, dentro da dinâmica catequética do evangelista, pertence ao segundo livrinho que trabalha “A dinâmica do Reino”. O evangelista procura deixar claro para a sua comunidade, que era composta por judeus convertidos ao cristianismo, que Justiça do Reino se dá essencialmente na prática da misericórdia.
            O texto bíblico afirma que Jesus estava sentado à mesa, na casa de Mateus. Junto com ele estavam alguns cobradores de impostos e pecadores. Tratava-se de homens cujos costumes pessoais ou cuja profissão mal afamada os tornavam “impuros” e indignos de convivência. Eram, sobretudo, suspeitos por não observarem muitas leis referentes a alimentação e donde surgiam problemas de comensalidade. Com a citação de Oséias 6, 6, Mateus esclarece o sentido da missão de Jesus: a justiça do Reino é inseparável da misericórdia.
            Esta experiência deste evangelho de hoje nos ensina muito, pois, nos ensina a romper com estruturas que nós mesmos criamos e não deixamos que essa misericórdia de Deus aconteça em nós e por meio de nós. Jesus rompe os esquemas sociais que dividem os homens em bons e maus, puros e impuros. A impressão que se tem é de que o ser humano faz exatamente o contrário daquilo que Jesus nos ensina. Enquanto Ele rompe com essas estruturas, nós criamos outras estruturas que nos impedem de criarmos novas relações mais justas e humanas.
            Está na hora de acabarmos com tanta hipocrisia que existe em nossa sociedade e em nossas igrejas. Precisamos aprender que a misericórdia é fruto de um amor que não tem limites, nem barreiras, nem fronteiras, não se impõe e nem exclui ninguém. Precisamos aprender que o amor não é simplesmente um sentimento, pois, dizer “eu te amo” até o pior de todos os bandidos pode dizer. Precisamos aprender que o amor é, acima de tudo, uma atitude, ou seja, temos que ter atitudes que falem de amor. 

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Evangelho Mt 8, 1-4

         Esta narrativa de hoje, dentro da dinâmica catequética de Mateus, pertence ao início do segundo livrinho “A dinâmica do Reino”. Para Mateus o Reino de Deus não é algo estático, mas se trata de algo dinâmico onde, dentro dessa dinamicidade, Jesus vai mostrar e tomar consciência do seu messianismo. Dessa forma, mostrará em que a Justiça do Reino supera a justiça dos homens.
Esta primeira parte do segundo livrinho é narrativa, onde o evangelista fará o relato dos dez milagres: a cura de um leproso (8, 1-4); cura do servo de um centurião (8, 5-13); cura da sogra de Pedro (8, 14-15); diversas curas (8, 16-17); a tempestade acalmada (8, 23-27); cura de um paralítico (9, 1-8); a ressurreição da filha de Jairo (9, 18-19.23-26); cura de uma hemorroíssa (9, 20-22); cura de dois cegos (9, 27-31); cura de um endemoninhado mudo (9, 32-34). Com isso Mateus quer mostrar a autoridade de Jesus.
Nesse episódio de hoje há algo que nos chama a atenção. O leproso sabia que quem estava em sua frente era Jesus, o filho de Deus, o Messias, aquele que tinha o poder para livrá-lo de vez da sua enfermidade. No entanto, para surpresa de todos, inclusive de Jesus, ele não pede a cura. Ele pede para ser purificado. Percebe-se, então, que há um mal muito maior e que precisa ser curado. O leproso era um marginalizado da vida social. Através da cura, Jesus o reintegra na comunidade. O verdadeiro cumprimento da lei não é declarar quem é puro ou impuro, mas fazer com que a pessoa fique purificada.
Peçamos ao Deus da vida que nós estejamos sempre prontos para escutar a sua Palavra e vivenciá-la no coração, na vida e na missão (Shemá). Que Ele esteja sempre conosco nos ajudando a identificar as “lepras” da nossa sociedade para que sejam transformadas em sinais de vida. Que o amor de Deus esteja sempre em nossos corações. Amém!

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Evangelho de Mt 6, 19-23

           Este evangelho de hoje ainda pertence ao conhecido “Sermão da montanha”, um longo discurso que Jesus profere onde ele vai dar alguns ensinamentos e orientações para a multidão. Lembrando que, dentro da dinâmica catequética de Mateus, estamos dentro do primeiro livrinho que trabalha “A Justiça do Reino”.
            Neste discurso, Mateus realmente quer desenvolver em cada um de nós a dimensão dos valores que são fundamentais para as nossas vidas. Desta forma, o evangelista já nos prepara para o episódio que vem a seguir que é o lindíssimo e antropológico discurso dos lírios do campo, que é conhecido como “Olhai os lírios do campo”. O discurso dos lírios do campo nos mostra o verdadeiro valor que o ser humano tem aos olhos de Deus e nos leva a fazermos vários questionamentos, como por exemplo: Qual o valor que o ser humano tem para mim? O quê a presença do outro em minha vida me traz, me desperta? Qual o lugar Deus ocupa em minha vida e em meu coração? (Cf. Mt 6, 25-34 e Sl 8).
            Todo ser humano, consciente ou inconscientemente, tem na vida um valor fundamental, um absoluto que determina toda a sua forma de ser e viver. Em nossas vidas, qual é o absoluto: Deus ou as riquezas? Deus leva o ser humano à liberdade e à vida, através da justiça que gera a partilha e a fraternidade. As riquezas são resultado da opressão e da exploração, levando o ser humano à escravidão e à morte. É preciso escolher a qual dos dois queremos servir. “Hoje eu tomo o céu e a terra como testemunhas contra vocês: Eu lhes propus a vida ou a morte, a benção ou a maldição. Escolhe, portanto, a vida para que você e seus descendentes possam viver” (Dt 30, 19).
            Aprendamos, pois, com Jesus a olhar para o homem e para a mulher e ver aquilo que eles realmente são: seres humanos. E como todo ser humano merecem e devem ser respeitados e, acima de tudo, amados. Que os nossos olhos sejam verdadeiramente as lâmpadas do nosso coração. Que o nosso olhar para a humanidade seja o olhar misericordioso, cheio de ternura e acolhedor de Jesus para com nossos irmãos e irmãs. Amém!   

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Mateus 5, 27-32

        O Evangelho de Mateus é uma verdadeira catequese que o evangelista dá à sua comunidade. É dividido em 5 (cinco) livrinhos, a saber: 1° A Justiça do Reino (capítulos do 3 ao 7), 2° A Dinâmica do Reino (capítulos do 8 ao 10), 3° O Mistério do Reino (capítulos do 11 ao 13, 52), 4° A Igreja Semente do Reino (capítulos 13, 53 ao 18) e 5° A Vinda Definitiva do Reino (capítulos 19 ao 28). Este Evangelho de hoje pertence ao capítulo quinto de Mateus, que é o início do chamado Sermão da Montanha. Trata-se de um longo discurso de Jesus que culmina com uma belíssima oração de Jesus dirigida a ao Pai (Cf. M 11, 25-30).
            O Evangelho desta sexta-feira pertence ao 1° Livrinho onde o evangelista procura trabalhar a Justiça do Reino. Mateus quer mostrar para a comunidade a qual ele escreve seu Evangelho que a justiça dos homens seguem a lei pela lei, isto é, que se trata de um mero cumprimento de normas e regras. Ao agirmos dessa maneira, acabamos por realizar gestos vazios, que não dizem nada. Mateus mostra, também, que aquele o aquela que faz uma adesão ao projeto do Pai apresentado por Jesus, que a sua Justiça tem que estar acima da justiça dos homens, que não se trata pura e simplesmente de cumprir a lei pela lei, mas, que a lei tem que ser superada por um agir que promova a vida e traga a liberdade às pessoas.
            Jesus radicaliza até à interioridade a fidelidade matrimonial, apelando aoamor verdadeiro e leal. O adultério começa com o olhar de desejo, e o mal dever ser cortado pela raiz. A exceção citada no v. 32 pode referir-se ao caso de união ilegítima, por causa do grau de parentesco que trazia impedimento matrimonial segundo a lei (Cf. Lv 18, 6-18 e At 15, 29). Agindo dessa maneira, Jesus faz com que a lei seja superada por uma nova regra: a regra do AMOR que tem que estar acima de tudo, um amor que se dá na liberdade dos filhos e filhas de Deus. Dentro dessa dimensão profunda do amor se encontra o ser humano.
            Deixemos que essas palavras de Jesus penetre todo o nosso ser, a nossa vida e nos mostre o caminho a ser percorrido. Caminho da vida e do amor que percorremos juntos, formando a nova comunidade dos filhos e filhas de Deus. Que essas palavras do Santo Evangelho encontrem um chão fértil em nossos corações.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

CONVERSÃO E RENOVAÇÃO EM OSÉIAS 14, 2-9 (por José Bakir)

1.    Situação religiosa de Israel
Dentro desta questão da situação religiosa, Israel vivia em uma situação de infidelidade. Esta infidelidade se mostra antes de tudo no culto a Baal, que era considerado o deus da fertilidade. No culto a Baal se praticava às vezes a prostituição sagrada, o que acarretará a infidelidade das mulheres, os filhos bastardos e a esterilidade. No culto a Yhwh continuava a perversão de representá-lo em imagem de ouro. Outra forma de infidelidade são as alianças políticas, em particular com a Assíria e o Egito, dos quais o poderio político e militar ocupa o lugar de Deus. Suas conseqüências são a dependência política e econômica, tributos pesados, por fim a repressão e a deportação.
Com relação ao culto aos baal (senhor/proprietário = deus da fertilidade) a religião baalista é, fundamentalmente, da natureza e procura garantir a fertilidade do solo e dos animais. Aqui se percebe a diferença com o javismo que prega uma questão ética no relacionamento entre os seres humanos. Quando Baal não consegue realizar a tarefa dele, vem a seca, o que quer dizer que Baal morreu. Na realidade ele estará sempre nesta luta contínua com as forças da natureza. Quando ocorre o período da seca, que quer dizer a morte de Baal, Anat, sua irmã/esposa, luta contra Mot, vence e liberta Baal que volta a trazer as chuvas e a fertilidade sobre a terra.
O que acontecia no culto a Baal era uma hierogamia (casamento sagrado) era uma mímica do que aconteceu entre Baal e a natureza. A chuva representa o esperma de Baal fecundando a terra. Dentro do culto tinha a questão das imagens como representação de Baal.
A diferença do baalismo com o javismo é que o javismo tem uma preocupação ética no relacionamento entre as pessoas, é uma religião de um Deus presente na história do seu povo e a terra pertence a Javé, o homem apenas cuida dela. Como Baal não tinha lugar comum onde pudesse ser cultuado, era fácil expandir o baalismo. Em se tratando de prática de rituais os israelitas aprenderam dos cananeus que tinham uma cultura religiosa sedentária.


2.    Israel sempre tendente ao pecado
O profeta inicia seu profetismo a partir de uma experiência pessoal: apaixonou-se e casou-se com uma prostituta. Tal experiência o marcou profundamente, pois, ele a amava muito e ela o abandonou. Mas, apesar de ter sido abandonado pela mulher amada, ele continuou a amá-la e a recebeu novamente, depois de pô-la à prova.
A experiência de vida do profeta é de suma importância para sua pregação. Seu matrimônio não foi um ato simbólico. Isto realmente aconteceu na vida do profeta e se dá pelo fato de os nomes da mulher e do pai dela na ter nenhuma relação simbólica. Outro fato é o nome da filha em uma realidade machista. Sua vida transforma-se em uma espécie de parábola que o ajudará a compreender o processo de relação de Deus com o povo que leva a uma conversão e servirá de auxílio em sua pregação.
Em Oséias é expresso pela primeira vez a relação entre o Senhor e Israel nos termos de um matrimônio. Toda sua mensagem tem como tema principal o amor de Deus desprezado por seu povo. A imagem do amor do profeta por uma prostituta relacionada ao amor de Deus por Israel exemplifica bem a idéia de um povo que tende sempre para o pecado. Dificilmente uma prostituta se converte totalmente a um único homem, ou melhor, a único amor. Ela pode permanecer ligada a este amor por um determinado tempo, mas, volta a se “perder” entre outros amores por causa de sua infidelidade. Assim como a prostituta, Israel portou-se como uma mulher infiel e provocou a ira e o ciúme de seu “esposo divino”, o qual não deixa de amá-la, e a castigará, mas, com o desejo de reconduzi-la a si e devolver-lhe as alegrias do seu primeiro amor.
É esta relação que vai permear o relacionamento entre o Senhor e seu povo Israel. De um lado o povo que permanecia infiel e fazendo cultos aos baais. Do outro um Deus que ama e está sempre disposto a perdoar.

3.    Javé está sempre disposto a perdoar
O eixo central da pregação de Oséias é a teologia do amor de Deus para com o seu povo. Quando o profeta pensa esta temática ele pensa, como conseqüência da acolhida deste amor, em uma atitude de miséria entre o povo.
A compreensão da relação deste amor se dá a partir da experiência concreta na vida do profeta, pois, para ele esta relação está ligada a uma fidelidade de Israel a este amor. Para ele o amor de Deus independe da resposta de Israel (11,9). O amor de Deus é totalmente gratuito. Este conceito de amor-misericórdia se torna central na pregação de Oséias e torna-se mais figurante na medida em que Deus tem amor por um povo que não tem amor. O cap. 11 é um relato do conflito entre Deus e o povo por causa desta relação deste amor.
A razão é significativa: “um homem cederia à cólera provocada uma e outra vez, desligar-se-ia de um pacto violado pela outra parte”1. Deus, porém, não está condicionado pelo comportamento humano: a santidade de Deus pode manifestar-se convertendo e salvando. Não obstante o comportamento obstinado do povo, o Santo continuou no meio do seu povo, não atingido pela agressão do inimigo nem pelo afastamento dos seus. Somente atingido e como que transtornado por amor mais forte que tudo o mais.
No capítulo 11 o profeta compara a relação entre Deus e Israel como a relação que existe entre pai e filho. Embora não compreendido, Javé permanece fiel e, no seu amor, continua sempre de braços abertos para receber o filho de volta. É este o amor que Deus tem para com o seu povo, um amor incondicional que não mede esforços. Com isto o profeta quer mostrar que o Senhor tem em vista a reconciliação de seu povo com Ele.
Oséias revela a questão do “conflito” existente entre Iahweh e seu povo escolhido. Porém, a palavra de Deus fala mais forte e esta palavra é do amor. Um amor incondicional que, apesar dos erros cometidos pelo povo, é capaz de perdoar e renovar a aliança feita com o povo. É deste amor que o profeta fala ao relacionar a sua experiência de vida com a experiência de Deus para com Israel.




4.    Compreendendo o texto de Os 14, 2-9:
5.    2. Volta, Israel para o Senhor teu Deus,
pois, tropeçaste em tua falta.
6.    Chamado à conversão e ao arrependimento.
7.    3. Levai as palavras na ponta da língua, voltai-vos para o Senhor e dizei-lhe: “Perdoa toda culpa e segura a felicidade, e nós retribuiremos com o fruto dos lábios”.
8.    Não se fazem cálculos interessados, fundamentados em falsas seguranças: pede-se o perdão e há o propósito de corrigir-se. O povo apresenta agora como dom a confissão de seus lábios.
9.    4. A Assíria não nos pode salvar, não montaremos a cavalo e não diremos mais ‘Nosso Deus’ às obras de nossas mãos, _ ó tu que tens piedade do órfão!”.
10.  A Assíria sintetiza a política de alianças, a cavalaria representa o poder militar. O Deus de Israel é essencialmente salvador, não por mérito ou direitos do homem, mas, porque se compadece dos fracos.
11.  5. Vou curar de sua desobediência, eu os amarei com generosidade, pois a minha ira afastou-se dele.
12.  Resposta divina à confissão do seu povo que anuncia a vitória do amor sobre a ira.
13.  6. Serei como o orvalho para Israel, ele há de florescer como o lírio, lançará suas raízes como cedros do Líbano.
14.  Orvalho autêntico e efêmero. Fala da prosperidade de Israel que está representada pelo lírio.
15.  7. Seus galhos se espalharão, seu esplendor será como o da oliveira e seu perfume como o do Líbano
16.  Fala do futuro do povo de Israel.
17.  8. Voltarão aqueles que habitavam à sua sombra; farão reviver o trigo, florescerão como videira, sua lembrança será como a do vinho do Líbano
18.  “Sombra” oposta à idolatria de 4, 13. Seguindo o movimento das comparações, corrigimos o texto massorético, que diz: “darão vida ao grão” 7, 14 e 9, 1. Como videira, segundo 10, 1.
19.  9. Efraim! Que tenho ainda a ver com os ídolos? Eu é que tenho a resposta e quem olha para ele. Eu sou como cipreste sempre verde, de mim é que brota o teu fruto.
20.  Deus é quem fala. Ele nada tem a ver com os ídolos, “responde” à confissão e a súplica do povo, “olha” a sua aflição. Somente Deus pode assegurar a fecundidade de Efraim.

21.  Lugar e papel da perícope no conjunto do texto
Esta perícope é colocada no final do livro do profeta Oséias e nos remete ao início de sua profecia. O objetivo da pregação do profeta é provocar a conversão. Contudo, a mortandade não constitui o final. O lugar que ocupavam 2, 15-25 e 11, 8-11, em suas respectivas unidades, o ocupa este final, que é além disso final de todo o livro. Por isso não é acidental que se abra com chamado à conversão e termine com a garantia dos frutos.
A perícope que antecede é 13, 12-14, 1 que trata da ruína inevitável. Nesta perícope percebe-se que em marco que fecham pecado e reato, apresentam-se duas imagens rápidas de fecundidade, tanto no mundo humano como no vegetal. Entre as duas compõem a correlação de culpa e castigo.
As dores fecundas da parturiente são imagem que vai passar até o pensamento apocalíptico como dores da história a fim de dar à luz nova era. Assim como existe uma sensatez ou instinto vital que ensina às escuras, também existe um juízo ou sensatez histórica, que o homem cultiva e a palavra de Deus educa. O contrário é a inconsciência ou rebeldia fatias: recusar a brecha pela qual se sai para a luz e para a vida. Temores, nostalgias avitas que nos deixam fechados e sepultados, com nosso pecado e nossa culpa. O que liberta são a firmeza vigilante, o rompimento corajoso. Oséias nos transmitiu nestes versos um símbolo magnífico e riquíssimo que diversos autores, tanto do AT como do NT, encarregar-se-ão de explorar.
A perícope que segue a que estamos trabalhando aqui é 14, 10. Este pequeno trecho trata da questão da advertência final. Acredita-se que se trata de um acréscimo em estilo sapiencial2.
O autor que, com os oráculos de Oséias, compôs o livro que leva esse nome, acrescentou esta nota final para o leitor. Com um par de repetições, ele a aprendeu ao resto do livro. A leitura pode surtir estranha e difícil, exige esforço de compreensão como também atitude correta. Porque o livro descreve os caminhos, o estilo de Deus, que em si são sinceros e retos. Se o homem que os percorre tropeça, se escandaliza, isso é devido à sua atitude rebelde. Compreender não é ato puramente intelectual: não é ato, visto ser caminho que se percorre, não é puramente intelectual, visto exigir atitude correta. Não se trata de ciência, mas, sim, de sabedoria. A palavra profética convida e desafia o homem.

6.    A esperança de Javé em ralação a Israel
Como já foi dito anteriormente o objetivo da pregação do profeta é provocar a conversão3. A esposa infiel (Israel) não só é reprovada e censurada pelo esposo fiel (Javé) irado, mas, é também, e principalmente, cortejada e convidada a retomar seu amor verdadeiro e deixar seus amantes, sua prostituição.
A palavra chave do livro é converter-se, voltar. De fato, nestes últimos oráculos, há uma chamada à conversão, uma confissão do povo e o perdão divino. Também fica mais uma vez evidente que são os “amantes” que levam um povo à “prostituição”. É a política de submissão a potências estrangeiras, a confiança no poderio militar e o culto a outras divindades, enfim, em nada disso se podem encontrar a certeza de uma recuperação política, um florescimento econômico e até mesmo a salvação. Podemos concluir que todo o livro de Oséias gira em torno do primeiro mandamento do decálogo.
O eixo central da teologia de Oséias é, em suma, a teologia do amor de Deus para com seu povo. Quando o profeta pensa esta temática ele pensa, como conseqüência da acolhida deste amor, em uma atitude de misericórdia entre o povo. A compreensão da relação deste amor se dá na experiência concreta na vida do profeta, pois, para ele esta relação está ligada a uma fidelidade de Israel a este amor. Para Oséias o amor de Deus independe da resposta de Israel (Os 11, 9). O amor de Deus é totalmente gratuito. Este conceito de amor-misericordia se torna mais figurante na medida em que Deus tem amor por um povo que não tem amor. O capitulo 11 é um relato do conflito entre Deus e o povo por causa desta relação de amor.
Para que realmente haja um verdadeiro amor do povo por Deus, é necessário ter um conhecimento deste Deus. Não se trata de um conhecimento teórico/científico, mas, sim, de um conhecimento interno, de uma experiência pessoal, de comunhão profunda de Deus. O profeta fala de que o povo de Israel não tem este “conhecimento de Deus” (6, 6). A fidelidade a Deus não reconhecida em um culto falso, mas, na prática da misericórdia. Neste sentido o profeta culpa os sacerdotes. O profeta se levanta contra esta lógica e não culpa somente o povo (4, 4-10 e 6, 9)
A falta de conhecimento de Deus gera a falta de misericórdia que, por sua vez, gera a injustiça social. É como se eles praticassem injustiças e não tivessem nenhum pesar. Da parte do profeta, ele acredita que Israel não é um povo confiável (6, 4). Ele quer dizer que a fidelidade de Israel é quase inexistente (9, 10). Trata de um amor que de nada vale, pois, na primeira oportunidade eles pecam. Em Os 12, 4-5 diz que ainda no seio materno já se cometia injustiça.
O profeta apresenta um Deus que está sempre disposto a amar e a perdoar. Deus tem pelo seu povo um amor incondicional e sempre age em favor dos seus porque foi Ele mesmo quem os escolheu. Ao mesmo tempo Deus espera que também o seu povo use de misericórdia no relacionamento entre eles. É a prática deste amor fraterno e a fidelidade a Javé que livrará o povo da idolatria e, por conseqüência, das injustiças sociais.

7.    Relação entre Os 14, 2-9 e a experiência matrimonial do profeta
Esta perícope trata de um convite à conversão feito por Deus, através do profeta, a seu povo Israel. Para que realmente haja uma conversão verdadeira é necessária uma abertura de ambas as partes, tanto daquele que está chamando a conversão, quanto daquele que está sendo convidado. Neste sentido Deus se coloca inteiramente aberto para perdoar seu povo.
Na relação desta passagem com a experiência matrimonial do profeta que é abandonado pela mulher amada, é o profeta quem vai atrás e faz com que sua esposa se arrependa do mal que fez e volte ao seu senhor. É bonito de se perceber que a tentativa de esquecer a esposa é inútil. O amor é maior que a humilhação e provoca a esperança de que ela mude de atitude. Quem sabe tratando-a com carinho, fazendo uma nova viagem de núpcias, ela reconheça seu erro e volte ao verdadeiro amor, ao recordar os primeiros tempos de casamento.
É exatamente o que Deus faz com seu povo. Relembra os tempos quando o libertou da escravidão do Egito, fazendo com ele uma aliança no deserto. Agora, mais uma vez, promete-lhe paz e abundância na terra da promessa. Embora não compreendido, Javé permanece sempre e, no seu amor, continua sempre de braços abertos para acolher a “esposa” de volta. É deste amor que nos fala esta relação matrimonial do profeta e a relação entre Deus e o povo.
No que diz respeito a esta relação de amor entre Deus e Israel Amsler diz que:

A história de Iahweh e Israel, começada como um encontro amoroso, termina com a evocação da união fecunda de Deus e de seu povo (14, 9; 2, 23-25). O Deus de Oséias é Deus de amor: a primeira palavra nessa aventura foi dele e dele será também a última.4

Aqui se percebe que desde o início esta relação existente entre Deus e o povo é permeada pele amor. Nesta relação quem permanece infiel é o povo e Deus, com sua fidelidade, permanece aberto e disposto a perdoar. Quando Amsler fala que a última palavra é a de Deus ele se refere exatamente a este amor que norteia a relação Deus = homem.

8.    Conclusão
Para o profeta, o conhecimento de Deus não é uma atitude intelectual, mas, uma adesão amorosa, através de uma prática que corresponda ao projeto de Deus, elaborado no deserto por ocasião do êxodo. Então sim: Javé receberá novamente seu povo como “esposa”, dispensando-lhe todo o carinho (2, 4-25), ou tratando-o como um filho.
Já que Oséias teve a audácia de dizer, é preciso que também nós digamos com ele: O Senhor é um Deus apaixonado. Fala do seu desejo, da sua decepção, da sua indignação, da sua cólera e também da sua ternura. É importante perceber que esta ternura é sempre mais forte, pois, a última palavra não pertence à cólera e à punição, mas, à felicidade numa união para sempre fiel. Trata-se de uma ternura que é o contrário da fraqueza: é força de Deus, capaz de transformar o coração do homem e de fazer desaparecer até a recordação do pecado. Deus não espera o retorno do pecador para ir-lhe ao encontro.
O livro de Oséias vai ao que há de mais profundo na teologia e na piedade, pois, revelando a ternura de Deus, reverá Deus tal como Ele é: Amor. Esta definição também se encontra no Evangelho de João onde ele nos diz que Deus é amor. É preciso que saibamos compreender o que realmente este amor, que é o próprio Deus e que Ele tem por nós, representa e significa para nós. A partir do momento que compreendermos este amor, compreenderemos também a mensagem belíssima do profeta.




BIBLIOGHRAFIA
SCHOKEL, L. Alonso e DIAZ, J. L. Sicre. Profetas II. Grandes comentários bíblicos. São Paulo: Paulinas 1991. pp. 887-951
AMSELER et alii. Os profetas e os livros proféticos. São Paulo: Paulinas, 1992. pp. 67-95
Introdução das Bíblias Jerusalém, TEB e Pastoral
1 Cf. SCHOKEL e DIAZ. Profetas II. Grandes comentários bíblicos. São Paulo: Paulinas, 1991. p. 941.
2 Cf nota “e” em Os 14, 10, Bíblia de Jerusalém
3 Cf nota em Os 14, 2-9, Bíblia Pastoral.

4 AMSELER et alii. Os profetas e os livros proféticos, p. 79

quinta-feira, 6 de junho de 2013

LUCAS 15, 3-7

Este evangelho de hoje pertence ao capítulo 15 (quinze) do Evangelho de São Lucas. O capítulo 15 de Lucas é o centro de toda a sua mensagem, tanto do Evangelho, quanto dos Atos dos Apóstolos, onde o ápice é a parábola do Pai Misericordioso (cf. Lc 15, 11-32). As três parábolas são marcadas pela procura, pela alegria – que em Lucas trata-se da alegria escatológica – e pela espera.
            A narrativa de hoje é a ovelha perdida. Esta narrativa é um convite feito a cada um de nós, que lemos e rezamos este evangelho no dia de hoje, a olharmos pra dentro de nós mesmos e a refletirmos sobre nossas atitudes. E nesta reflexão nos questionarmos: Será que temos coragem de abrir mão daquilo que temos e somos para irmos atrás desse algo mais que Deus tem a nos oferecer? Num primeiro momento a nossa resposta pode ser positiva. Mas, como dizia o saudoso economista Joelmir Beting, “A teoria, na prática, é diferente”, isto é, no momento de colocarmos em prática a nossa resposta, não o fazemos.
            Há que se questionar também por que deixar noventa e nove ovelhas e ir atrás de apenas uma? A resposta é muito simples e, até certo ponto, lógica: é porque esta ovelha que se perdeu é a mais bonita, a mais valiosa aos olhos do dono. Com isto, o evangelista quer nos dizer que para Deus temos um valor imenso, somos belos aos olhos do pai. A parábola não quer dizer que Deus prefere o pecador ao justo, ou que os justos sejam hipócritas. Ela ressalta o mistério do amor do Pai que se alegra em acolher o pecador arrependido ao lado do justo que persevera. Não devemos esquecer que, em Lucas, a alegria é escatológica, isto é, a alegria de entrarmos todos no Reino de Deus.
            Hoje a Igreja nos convida a celebrarmos a festa do Sagrado Coração de Jesus. Celebrarmos esta festa é lembrarmos que do coração aberto de Jesus jorrou sangue e água em sinal de uma entrega total, uma doação. É lembrarmos também que toda a humanidade está colocada no coração de Jesus, no mais intimo de Deus, de onde só pode sair coisas boas e belas. Nos mostra a beleza de um Deus que se revela a nós na simplicidade das coisas, na beleza do amor de um Deus que nos ama muito. Aprendamos com Jesus o que é o amor. Deixemos que este amor penetre o nosso coração e nos transforme, nos dando vida e força na caminhada. Amém!