terça-feira, 1 de julho de 2008

A força que nunca seca

José Bakir

"A força que nunca seca"

"Pra cada braço uma força

De força não geme uma nota

A lata só cerca, não leva

A água na estrada morta

E a força nunca seca

Pra água que é tão pouca.

Pra cada braço uma força

De força não geme uma nota

A lata só cerca, não leva

A água na estrada morta

E a força nunca seca

Pra vida que é tão pouca."

(Chico César e Vanessa da Matta)

Com a epígrafe desta música de Chico César e Vanessa da Matta, que ficou belíssima na voz de Maria Bethânia, gostaria de começar o trabalho que se dará a partir de uma entrevista de Frei Betto1 ao programa Retratos, da TV Horizonte de Belo Horizonte. Nesta entrevista são abordadas questões latentes à realidade sócio-política-econôminca que o nosso país está vivendo e apontadas algumas possíveis soluções para a realidade crítica do Brasil.

Em se tratando de questões políticas percebe-se que existe um distanciamento entre o poder político e o povo brasileiro. "Brasília está longe do Brasil", um distanciamento de alguns políticos da realidade de miséria em que vive o restante do país. Isto é uma prova de que o poder dá ao ser humano algumas regalias e bajulações, como também, bajuladores. Neste sentido, o próprio Frei Betto diz que "o poder não transforma as pessoas, faz com que se revelem".

O que se percebe é que o atual governo ficou muito aquém das expectativas do povo brasileiro. Houve um grande avanço na política externa brasileira, porém, a política econômica precisa melhorar. O maior erro do PT foi ter vestido a camisa do poder, deixando de lado a camisa popular que sempre vestiu e com a qual ganhou imenso números de eleitores.

Um ponto interessante é quando Frei Betto afirma que "nem sempre quem governa tem o poder, tem parcela do poder, mas, não não tem o poder". Isto mostra a realidade funcional da política. Não é simplesmente o fato de o presidente ter sido eleito por maioria dos votos que dá a ele o direito de governar o país com soberania. Tem um grupo de empresários fortes por trás que muitas vezes é quem governa para o presidente. A grande questão que se pode fazer é: qual o papel do presidente? Ser apenas eleito para dizer que o país tem um presidente? Penso que a saída não por é aí, que existem outros caminhos mais fáceis de serem percorridos pela política.

No ano de 2002, antes mesmo de ser anunciado como candidato do PT para disputar as eleições presidenciais daquele ano, o então presidente Luis Inácio Lula da Silva fez uma palestra no auditório da Universidade Católica de Brasília (UCB) para um grupo de estudantes universitários e a comunidade local. No decorrer da palestra ele foi indagado por uma universitária sobre o fato de algumas pessoas dizerem abertamente que não gostavam de política e que não ligavam muito para os problemas políticos do nosso país. A esta indagação veio a resposta com uma frase que marcou quem estava presente naquele auditório: "O problema de quem não gosta de política é que são governados por quem gosta". Esta mesma frase foi dita por Frei Betto, ainda que com palavras diferentes: "Quem tem nojo da política é governado por quem não tem". É uma afirmação que nos leva a refletir sobre o nosso papel dentro do quadro político do nosso país.

Esta reflexão é importante no sentido em que ajuda a sociedade civil a se organizar enquanto movimentos populares. A socidade civil organizada através de movimentos sociais é mais importante que os partidos, pois, é a sociedade que conquista seus direitos. Quem não se mobiliza não alcança os direitos reivindicados. Para que nossa democracia passe de meramente representativa para participativa é preciso fortalecer os movimentos populares.

Um outro ponto abordado na entrevista e que vale a pena ser levantado neste trabalho é a questão do programa do governo chamado "Fome Zero". Ainda hoje este programa não conseguiu entrar num ninxo fundamental que são as áreas de miséria das grandes cidades brasileiras. Falta gerenciamento para o programa. A porta com que as famílias assistidas pelo "Fome Zero", que é a reforma agrária, ainda não foi aberta. Sem a reforma agrária há o risco de, uma vez suspensa a distribuição de renda via bolsa família, haver um retorno de muitas destas famílias à miséria que viviam antes.

Infelizmente em nosso país a máquina do estado só serve para favorecer os grandes. Entristece muito saber que a elite tem um poder muito grande junto a qualquer governo. Com relação a isto os compositores Sergio Brito, Marcelo Fromer e Charles Gavin, da banda de rock Titãs, diz como uma forma de manifestar contra o sistema político que "tudo em que virar óleo pra por na máquina do Estado. Quem quer manter a ordem? Quem quer criar desordem?"2 A saída para este problema é saber votar bem, em priemiro lugar, e depois, fortalecer os movimentos populares, pois, o governo faz para quem pressiona mais.

Quando se fala em esquerda hoje é preciso lembrar que uma característica marcante de uma pessoa de esquerda é que ela pode perder tudo (a liberdade, a vida), mas, não pode perder a moral. Ser de esquerda é ficar indignado com as desigualdades sociais e ser de direita é considerar essas desigualdades tão naturais como o dia e a noite. Uma pessoa que tem a "bem aventurança" da fome de justiça é considerada de esquerda. Para o cristão, como ser humano, é ofensivo constatar que vivemos em um mundo com atualmente 6.500.000.000 de pessoas, das quais, 4.000.000.000 vivem abaixo da linha de pobreza segundo a ONU. São pobres daqueles que vivem com uma renda diária de no máxiom 2 dólares, ou mensal de no máximo 30 dólares. 1.000.500.000 pessoas vivem abaixo da linha da miséria, que corresponde a uma renda de no máximo 1 dólar por dia ou 30 dólares por mês. Não dá para dizer que o capitalismo é um êxito. Neste sentido, o fato de nascer em uma família rica não deveria representar nenhum privilégio, mas, uma dívida com a sociedade. É por isto que é importante o que chamamos de esquerda, pois, é importante continarmos acreditando em um outro mundo possível, porque este mundo é desumano, este mundo é anti-evangélico, este mundo não assegura – a uma grande parcela da população – direitos animais, de bichos. Não teremos paz enquanto não implementarmos a justiça.

Existem 2 projetos de paz no mundo: o do presidente Bush, que é a paz pela imposição das armas, e o outro do presidente Lula que é a paz pela promoção da justiça e esse é o grande desafio da sociedade mundial.

Voltando o tema para um contexto mais teológico pode se perguntar qual a relação entre fé e política? É preciso, acima de tudo, ter uma vida de oração ativa e aproximar mais dos oprimidos, dos exluídos, aproximando, desta forma, de Jesus. Este é o motivo pelo qual foi colocada como epígrafe a música de Chico Cesar e Vanessa da Matta. "A força que nunca seca" canta a vida e a história de um povo que luta e que sofre com os problemas causados pelas desigualdades sociais, má distriubuição de renda, falta de uma reforma agrária, discriminação, enfim, canta a história do povo pobre e miserável do nosso país. Mas, é interessante perceber que, apesar de todo este sofrimento, ainda resta uma esperança, ainda resta fé em Deus e em Cristo Jesus que se faz presente na vida e na história deste povo. É por isto que "a força nunca seca".

1 Frei Betto é religioso e escritor, escreveu mais de 50 obras dentre as quais seu mais recene livro: "Mosca azul: reflexão sobre o poder"

2 Música "Desordem" dos Titãs.

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